Ela o conheceu na tv. Já tinha visto aquele rosto familiar antes, aquele sorriso fácil e sincero, aquele jeitão de moleque levado. Mas achou que nunca passaria disso...
Ele estava desiludido. Tinha apostado todas as suas fichas em uma história de amor que tinha tudo pra dar certo: trabalhavam juntos, tinham quase a mesma idade, os mesmos ideais. Mas um dia, como que de repente, ela pediu para ir embora. Não doeu, não machucou. Ele sabia que era o melhor a ser fazer e que eles seriam amigos pra sempre. E ele achou que a vida seria só aquilo. Que nunca passaria disso...
Mais um dia de trabalho, ou melhor, uma madrugada. A garota levantou cedíssimo para se arrumar e esperar a carona para ir para a reunião de trabalho na capital. Ela adorava esses programas porque era a chance de sair da rotina, de conhecer o novo. Mas esta viagem não seria como as outras. Na pressa, ela apenas tomou uma xícara de café. O vai-e-vem da estrada, as curvas e o vento frio no rosto fizeram com que seu estômago reclamasse. E ela passou muito mal no meio da viagem. Tanto que achou que não agüentaria chegar ao seu destino final. Ligou pra mãe desesperada pedindo ajuda divina e soube, naquele instante, que essa ajuda seria mais que especial: enquanto falava com a mãe, viu um livro na estante do posto de gasolina que tinha um título muito sugestivo: A ORAÇÃO DAS MÃES É PODEROSA. Assim, ela sabia que estava a salvo.
Para ele também seria mais um dia de trabalho. Correr atrás de patrocínio, reuniões intermináveis com investidores, conversas com amigos. E, no meio da manhã, recebeu um convite para um almoço com um antigo amigo que não via há muito tempo. Combinaram de se encontrar no restaurante de um clube para colocar a conversa em dia e falar sobre novos projetos. Ele ficou muito feliz porque esse amigo já tinha lhe proporcionado ótimas oportunidades de trabalho, além de ser uma excelente companhia. Assim, ele sabia que estava a salvo.
Quando ela chegou ao seu destino final, foi prontamente atendida por uma de suas colegas de trabalho que a tinha em alta conta. Toda prestativa, essa amiga determinou que todos almoçariam decentemente naquele dia, após a reunião de trabalho, e que ela não permitiria que a garota comesse qualquer coisa na beira-da-estrada. Assim, após a reunião, eles seguiram para o restaurante de um clube muito badalado que ficava próximo ao escritório onde estavam. A garota ficou deslumbrada com o que viu: um enorme salão com duas mesas gigantes no centro, servindo comida e bebida boa, tudo muito sofisticado e apetitoso. Ela tentou disfarçar o espanto e a surpresa, mas era quase impossível porque ela não estava acostumada à tudo aquilo. E, por isso, amava tanto seu trabalho; queria aproveitar tudo que viesse dele. Ela estava encantada com o que via.
O reencontro com o amigo foi excelente. Conforme previsto, ele trazia ótimas notícias e grandes projetos à vista. Mas tudo parou naquele instante. Entre a multidão, ele a viu. Pequena, magra, com os cabelos semi-presos, ela chegou sorridente e deslumbrada no salão do restaurante. Parecia um pouco assustada com todo aquele movimento e prestava a atenção em todas as instruções que o senhor ao seu lado lhe dava. Vestia uma camisa listada de preto e azul-marinho, calça jeans, sapato preto. Carregava uma bolsa transpassada rosa que a deixava com o aspecto mais jovem ainda. Deslizava no salão como uma visão celestial. Para ele, o mundo tinha parado naquele segundo. Ele não prestava atenção em mais nada, muito menos na conversa do amigo que percebeu a situação imediatamente e correu os olhos pelo salão atrás do motivo da distração dele. Ele estava encantada com o que via.
Realmente, o almoço foi decente conforme prometido. Graças a Deus, não foi a empresa dela que pagou a refeição mas a empresa da amiga que tinha sugerido o almoço. Caso contrário, ela teria que lavar muita louça naquele dia para arcar com aquela conta. Após a refeição, todos se dirigiram para a sala do café e ela – que não podia nem sentir cheiro do café naquele dia – resolveu explorar o clube e conhecer suas instalações. Era final da hora do almoço.
- Vai lá! Essa a sua deixa, cara. – com essa quase ordem, ele a seguiu. Assim que ela se afastou do grupo que a acompanhava, ele se levantou e acompanhou seus passos pelo clube à uma distância segura. Há muito ele não flertava com uma garota – e aquela garota parecia ser mais que especial. Percebia o deslumbramento dela em cada passo, cada olhar. Ela analisava tudo como se tentasse absorver o mundo. De repente, se deteve na murada que dava para piscina do clube e ficou ali olhando, olhando. Ele esperava por uma chance de cumprimentà-la, trocar algumas poucas palavras mas não sabia como chegar. Aquele sentimento de aprenssão não era normal, ele nunca tinha sentido aquilo. Então, ele a ouviu falando como que para o vento:
- Isso aqui é muito lindo mesmo! – foi a deixa que ele esperava.
- É mesmo!
Ela olhou para trás assustada. Quem era aquele homem que a seguia? Por quê? Seu rosto era familiar, mas ela não conseguiu reconhecê-lo de pronto.
- Desculpe se a assustei. Meu nome é André.
- Prazer, Claúdia.- Ah, claro. Como poderia não reconhecê-lo? Era o ator da tv. Ela já o tinha visto diversas vezes em peças de teatros e trabalhos pequenos na televisão. Aquele rosto familiar de antes, aquele sorriso fácil e sincero, aquele jeitão de moleque levado.
Era final da hora do almoço. 31 de maio. Ali começava uma história de amor.